Rodrigo Nogueira celebra 10 anos como dramaturgo e conta detalhes de novos projetos
Completando 10 anos de carreira como dramaturgo em 2016, Rodrigo Nogueira já pode ser reconhecido com um dos novos contadores de história no teatro musical Brasil. Em seu trabalho, além de produções autorais que em estágio de leitura em Nova York, nos Estados Unidos, há produções nacionais como “Rock in Rio – O Musical”, “Chacrinha – O Musical”, escrito junto a Pedro Bial, “O Primeiro Musical A Gente Nunca Esquece” e adaptação de novela “Vamp”, exibida pela Rede Globo, para os palcos, com o auxílio de Antonio Calmon, autor original da obra.
Neste bate-papo exclusivo com o B!, Rodrigo compartilha um pouco da sua história e visão para o teatro musical brasileiro, sem deixar de lado outros gêneros que ao invés de se excluírem, são na verdade complementares.
B!: Em sua carreira existe um ponto em comum entre o o repórter aqui do outro lado das perguntas e o teatro. Contar histórias. Mas quando foi ponto de virada, que o teatro o tomou para si?
Rodrigo Nogueira: Eu sempre quis o teatro. O jornalismo foi uma forma de mentir pra mim mesmo que eu podia ter uma profissão com carteira assinada e local fixo de trabalho. Mas teve um dia específico que eu realmente tinha a certeza que ia parar no teatro. Eu era estagiário do O Globo em 2001 e lá funcionava assim: repórter e estagiário saíam juntos voltavam e escreviam suas reportagens. A do jornalista era publicada, a do estagiário arquivada. Um belo dia, tomei um susto ao ver a publicação de uma repórter com quem tinha saído no dia anterior. Ela tinha inventado metade da matéria pra tornar tudo mais interessante! E a matéria, com todas aquelas mentiras, foi publicada! Eu calei minha boca e pensei: vou escrever ficção. (nunca contei isso pra ninguém, mas de fato aconteceu).
B!: Você construiu boa tarde do seu trabalho, anteriormente, em espetáculos de teatro que não contemplavam o gênero “musical”. Mas a partir de 2013, vem atuando como autor do texto de vários espetáculos do gênero, que além de tudo, tem em comum uma dramaturgia nacional. Seja sobre a velhice, seja sobre jovens em um festival de música ou agora sobre vampiros em terreno brasileiro Não aquela “ufanista”, que recorre muitas vezes aos clichês da brasilidade (sem desmerecê-los, é claro), mas uma dramaturgia que fale de pessoas acima de tudo. Como é esse processo?
RN: Eu me interesso por histórias universais, com todo o clichê que essa frase carrega. Acho incrível que os musicais brasileiros possam falar diretamente do Brasil (como de certa forma fiz em chacrinha, com o Pedro Bial). Mas, pra mim, o que mais importa, seja em musical, filme, novela ou peça, é falar da condição humana. Por isso, eu agradeço todos os dias ao teatro que não contempla o gênero musical. Ele me ensinou muito!
B!: Em uma entrevista ao “O Globo”, você mencionou que não acreditava que escreveria um dia para musicais. E seus trabalhos mais recentes, vem sendo em cima deste gênero. Quando e por que você decidiu abraça-lo?
RN: Eu sempre tento me reinventar. Sempre. Em 2010, quando estava escrevendo uma novela na Record e fui indicado ao Prêmio Shell de melhor autor, fui convidado pra apresentar um reality show sensual no Multishow, o Casa Bonita. Pensei: agora que estou escrevendo novela e fui indicado ao Shell, o que é que falta na minha vida? Não tive dúvidas e aceitei o convite. Foi parecido com musicais, só que de um jeito mais especial, porque o convite veio do João Fonseca, meu mentor. Acontece que me apaixonei pelo gênero. Mas agora já acho que tenho que abandonar e voltar a me dedicar só a peças convencionais, de onde vim. Hora de mudar de novo. (risos)
B!: Ainda falando sobre dramaturgia do teatro musical nacional, vemos que ano após ano, ele vem ganhando cores cada vez mais brasileiras. Seja por meio das biografias ou de textos já famosos, como é o caso recente da adaptação recente de “O Beijo no Asfalto”, de Nelson Rodrigues. Como você enxerga esse movimento? E para você, sendo parte dele, qual é a sensação?
RN: Eu me ressinto por não fazer parte deste movimento como gostaria. Sou eternamente grato à Aventura (Entretenimento) que sempre me convida e confia em mim para os mais variados projetos e sempre os executa com muita qualidade. Mas a verdade é que nem um deles partiu de mim. Então, nunca tive a oportunidade de desenvolver um projeto musical autoral como “O beijo no asfalto” idealizado pelo Cláudio Lins. A única vez que pude fazer isso foi com o processo “Vida, o musical” no Teatro Ipanema, e posso dizer que ali sim foi um dos momentos mais felizes da minha carreira.
B!: Há aqueles que criticam o teatro musical pela sua veia dita “veia comercial”. Mas, de fato, não é muito diferente para uma peça comum, um filme. E também existem espetáculos que, mesmo sendo sucessos comerciais, também ganham o status de arte. Na sua opinião, o que falta na cabeça dessas pessoas para compreenderem que “arte” e “comércio” andam sim juntos, sem que um, muitas vezes possa desqualificar o outro?
RN: Acho um saco essa dicotomia. Realmente um saco. Mas talvez o que falte pra compreender que elas andam juntas, podemos pensar o que faz com que elas não andem, porque como sempre na vida (olha o clichê de novo), a moeda tem dois lados. Então, é importante pensar que:
1) os musicais, como qualquer peça, podem ser grandes produções com alto orçamento, ou pequenas, com baixo orçamento.
2) grandes produções precisam atingir mais público pra ter mais bilheteria.
3) para atingir mais público, você tem que falar pra mais gente e, portanto, abrir mais concessões.
Como pequenos musicais, de baixo orçamento em teatros menores ainda são mais raros no Brasil, os musicais grandes precisam fazer sucesso comercial. Cabe aos realizadores se preocuparem também com o lado artístico. Eu sempre tento. Acho que conseguimos um pouco com o “Chacrinha”, por exemplo.
B!: Que rumos você acredita que o teatro musical – brasileiro – está tomando nos próximos anos?
RN: Não me pergunta isso, odeio previsões! hahahahah. Mas posso dizer o rumo que gostaria que tomasse: ser mais diverso. Ter peças menores, mais autorais, mais originais. Vou confessar uma coisa: eu tendia a achar adaptações de clássicos para musicais uma bobagem, até ver “O Beijo no Asfalto”. Acho que eles conseguiram melhorar o texto do Nelson colocando as músicas junto com a peça. O fato de ter virado musical sublinhou positivamente um lado onírico da peça que ficava um pouco perdido em tudo que eu tinha visto antes. Foi a melhor montagem “do beijo” que vi na minha vida. Torço pra ter mais peças assim.
B!: Focando em seu trabalho mais recente, que está no forno, como é trabalhar com elementos típicos de uma cultura estrangeira – vampiros – mas dar uma cara nacional ao espetáculo. Além disso, como é transformar uma novela – que tem uma linguagem própria – em uma peça de teatro musical?
RN: Uma história é uma história seja ela novela, filme, peça, biografia ou conversa de bar. Então acho que essa parte não foi tão complicada. mas ainda é muito cedo pra falar de “Vamp”, porque, sendo um musical e inédito, a adaptação do texto é uma parte muito pequena do todo. Acho que só conseguimos ver a cara do espetáculo mesmo depois que entra em sala de ensaio. Então, vamos aguardar!
B!: O mundo do teatro está cheio de exemplos de obras que cruzaram caminhos diferentes, Livros, que viram peças, que viram musicais, que viram filmes (como por exemplo “A Cor Púrpura), ou que fazem o caminho contrário – (“Once”, por exemplo). Agora, como você um produto, de certa forma, inédito no mercado nacional – uma novela que dá origem a um musical?
RN: Acho maravilhoso beber na fonte da novela. Antes mesmo de saber que “Vamp” ia virar um musical tinha falado pra Aniela Jordan que a Aventura deveria investir na adaptação de uma novela. Eu dei a ideia de “Vale Tudo”, felizmente eles foram bem mais espertos do que eu e já tinham pensado em “Vamp”. (imagina, vale tudo – o musical! hahahaha) Mas voltando à adaptação, a exemplo do que acontece na Broadway, as pessoas têm mais interesse em ver uma história que elas já conhecem. Tem um lado ruim porque aqui em Nova York raramente se produzem histórias originais (faça uma lista mental dos musicais de maior sucesso dos últimos anos e veja quantos são originais. Pois é.), mas como nós brasileiros ainda estamos começando, transformar histórias conhecidas em musicais para atrair público ainda está valendo. E muito!
B!: O que podemos esperar, em termos de história, de músicas e de outros elementos deste próximo trabalho?
RN: Amaria contar tudo, mas ainda não posso. Só posso dizer que devemos ter músicas autorais e acho isso crucial para o futuro do musical no Brasil. Torço pra cada vez mais musicais com músicas autorais.
B!: Se você pudesse, escrever agora um musical, peça, filme, alguma história sobre algum tema que tivesse como única limitação, ser refente à cultura nacional, o que você escolheria?
RN: Olha, vou ser bem safado na resposta. Eu escreveria a história de “Vida, O musical”, que é a história de um homem que tem uma crise existencial porque gostaria que a sua vida fosse um musical: a mesma que comecei a desenvolver no Rio de Janeiro em 2014 e a mesma que estou desenvolvendo agora em Nova York. É referente à cultura nacional? Claro!!! Porque se eu escrevesse ela no Brasil ela estaria cheia de referências ao nosso dia a dia, à nossa maneira de pensar, ao nosso jeito de ver o mundo. Mas, se for pra dar uma resposta menos safada, acho que faria um musical infantil baseado em cantigas de roda brasileiras tradicionais. Ia curtir.